terça-feira, 16 de outubro de 2007

A CRUZ DAS ALMAS - UMA IDENTIDADE FANTASMA

Construir uma identidade não é uma tarefa fácil. Mantê-la ficou para poucos. Os povos que a levam a sério conseguem atingir um alto grau de desenvolvimento e civilidade, em que pesem o investimento maciço em educação e o apoio incondicional à cultura e à tradição. Aqueles que a desprezam em nome de uma modernidade barata, passageira e vazia, correm sérios riscos de serem varridos da história e da memória.
Monumento edificado para lembrar o marco inicial da colonização da Vila de Nossa Senhora da Piedade do Lagarto, a Cruz das Almas registra a passagem dos jesuítas Gaspar Lourenço e João Solônio pelas terras sergipanas à partir de 1575.
Localizado na antiga Tapera de São Tomé, atual Povoado Santo Antônio (nas proximidades do Rio Piauí), um dos símbolos mais importantes da identidade e da história lagartenses foi construído na administração do Prefeito José Ribeiro de Souza (Zé Ribeiro Coletor), inaugurado no dia 20 de abril de 1972.
A iniciativa da lembrança ficou a cargo do saudoso pesquisador e historiador lagartense Adalberto Fonseca, o qual não mediu esforços para dar uma feição identificatória à cidade que adotou como sua, tendo criado bandeira e também o hino.
Todos os anos, durante certo tempo, o local era ponto de encontro obrigatório dos lagartenses para as comemorações do aniversário da emancipação política da cidade, ocorridas sempre no dia 20 de abril de cada ano.
Nos últimos anos, a Cruz das Almas virou um ligar feio, abandonado e praticamente fantasma. Entregue à ação da grilagem, de lixeira e da depredação, o monumento está cada vez mais perdendo sua feição original, para revolta e tristeza dos amantes da cultura e da história de Lagarto.
Por várias vezes, solicitou-se do poder público e da iniciativa privada um pouco mais de atenção por aquele lugar. Mas os clamores não foram levados a sério e não tiveram a atenção merecida. Hoje, corre-se um risco enorme e premente de se perder, como quase tudo que lembra a mais pura identidade lagartense.
Enquanto cidades como Salvador e Recife investem pesado na reforma e preservação de casarios, monumentos e logradouros que marcam a identidade de seu povo, atraindo turistas e educando sua gente para o valor do patrimônio histórico, artístico e cultural, em Lagarto se assiste, em berço esplêndido, a morte à conta gotas de suas poucas marcas e testemunhos de um passado esplendoroso, quando Lagarto era lembrando por ser a cidade ternura e o berço da cultura sergipana.
Apelo mais uma vez para o bom-senso e sensibilidade do poder público, para a postura vigilante e atuante do Ministério Público, bem como para a criatividade e boa vontade da iniciativa privada, no sentido de socorrer a combalida cultura e história lagartenses, antes que elas desapareceram e virem almas penadas a assombrar nossa incompetência e nosso atraso.
Pois quando o leite se for derramado, não haverá como reavê-lo, pois as futuras gerações cobrarão o descaso e apagarão da memória os nomes daqueles que um dia ousaram matar a essência da gente lagartense.

Um comentário:

Irmã Giovana disse...

Após a leitura de tão belo e forte texto, onde o mesmo traz em suas linhas um forte chamado ao compromisso patrimonial, eu, sinto-me convidada a comentar.
Pernambucana consciente das verdades ditas, em tão pouco tempo nas terras lagartenses, posso contemplar o tanto de beleza e valor histórico adormecido e esquecido pelas autoridades.

Muito se vê em estruturas e nomes imortais, citados pela boca de grandes nomes da cidade e região. Ouvindo alguns lagartenses que amam sua história e a história do seu povo, desperta em meu coração o desejo de ver, em breve, tais valores sendo preservados, para que as nossas crianças e jovens, carreguem nas suas vidas, o valor da sua verdadeira e valiosa história!

Irmã Giovana Buarque